quarta-feira, 3 de novembro de 2021

DIVERSIDADE E INCLUSÃO: REFLEXÕES SOBRE A INSUSTENTÁVEL DUREZA DO SER

 

 A reflexão sobre Diversidade e Inclusão nos obriga a olhar para camadas profundas e complexas das relações humanas, porque cada um de nós experencia em si, o peso da vida. 

Antagônico ao título “A insustentável leveza do ser”, clássico escrito por Milan Kundera e considerado uma das obras mais filosóficas da literatura mundial, a proposta do artigo é que cada leitor pegue a dor do outro e a torne “co-sentida com outro, pelo outro, no lugar do outro, multiplicada pela imaginação, prolongada em centenas de ecos”, como o citado autor propôs em seu livro, e,  busque enxergar que talvez a sua própria dor não é tão pesada como daquele que se encontra à margem da sociedade.

Isto porque eu desafio a atirar a primeira pedra quem nunca se sentiu diferente, e, por conseguinte, excluído.

Como uma ideia contrária à leveza, que evoca a percepção da liberdade de SER de maneira independente ao que nos circunda, a exclusão traz consigo imposições das mais variadas do que se pode ou não fazer, do que se deve falar e calar, de quais são os limites de territórios e dos sonhos que se deve almejar, do que é certo ou errado, dos locais que se pode frequentar, do lugar na sociedade que se pode ocupar, sem se levar em conta que todos gozam dos mesmos direitos e liberdades assegurados pela constituição. Mais do que isso, gozam do direito ao respeito por simplesmente SER.

Ecoando através dos séculos, Shakespeare nos confronta com a pergunta” Ser ou não ser?”, ao mesmo tempo que nos apresenta um desafio com sua resposta “Eis a questão”, que como fantasmas do passado assombram a sociedade e exigem análise aprofundada, discussão sobre a questão e a adoção das mudanças que se fazem necessárias para que o Ser ou não ser, resulte em equidade, igualdade, justiça e inclusão.

E a questão da Inclusão passa pelo reconhecimento e acolhimento do SER do outro como diferente de mim, mas primordial para estabelecermos convivência e coexistência que faz com que todos tenham pertencimento e possam estabelecer vínculos e relações de reciprocidade, de dar e receber. Todas as relações acontecem pela troca de vivências e do que cada uma delas pode agregar para a evolução, porque avanço tecnológico e a conquista de bens materiais somente materializam a sociedade, mas não a tornam mais evoluída.

A evolução acontece quando o indivíduo aperfeiçoa mente, corpo e espírito impactando no coletivo. Neste sentido, ao tratar da Diversidade e Inclusão na Tecnologia, Tiago Barbosa, engenheiro de robótica, faz menção à desmaterialização das coisas, dando como exemplo, a própria mesa de trabalho dos profissionais, que no passado eram repletas de coisas que hoje estão dentro de seus celulares, notebooks, tablets, o que promove uma mudança do mindset que se tinha no passado de se materializar com a aquisição de bens. Ele ainda chama a atenção que nesta sociedade que vem sendo fortemente e rapidamente impactada por inovações tecnológicas, somente aqueles que desenvolverem suas melhores qualidades como seres humanos, sobreviverão e alcançarão desenvolvimento e êxito.



Então faz sentido para o bem comum segregarmos pessoas, levando-se em conta o gênero, a raça, a etnia, a nacionalidade, a orientação sexual, uma condição física diferenciada, a faixa etária, a condição sócio - econômica entre tantas outras diversidades? De fato, há a necessidade de segregarmos a sociedade, ou, pior, de sermos obrigados a nos organizarmos e associarmos por sermos diferentes ao invés de pensarmos em nos unirmos para a consecução de objetivos comuns?

Perguntas que não querem calar e que me impulsionaram a buscar respostas com aqueles inseridos nos mais variados contextos e diferentes de padrões estipulados. Algumas destas conversas informais, eu transformei numa série chamada Diversidade e Inclusão no meu canal do Youtube e compartilho algumas considerações unânimes para sua reflexão.  

https://youtube.com/playlist?list=PLwz_vLLdJTV55qCQYZE5ZpJuLSs1EPL4c

Na história da humanidade, vozes bradaram, confrontaram sendo algumas vezes ouvidas e em outras silenciadas. A primeira coisa que me chamou a atenção na falta de inclusão é o local de onde estas vozes emergem: na solidão que pode estar acompanhada ou não. Explico.

A Dra. Fernanda Ramos Pazello, ao tratar de Diversidade e Inclusão no Direito, trouxe à sua fala um fenômeno citado pela professora e conferencista Andréa Piscitelli na abertura dos trabalhos do WIT – Women in Tax Brasil, de que as mulheres são únicas nos ambientes profissionais, principalmente quando ascendem em suas carreiras.


Em 1994, no início de sua carreira, ela fez parte de muitas equipes em que era a única mulher, e, ao longo dos anos, observou um número crescente de mulheres que conquistaram seu espaço no Direito. Mas a perspectiva de ascensão e inclusão é frustrada quando se avalia a participação dos grupos de minorias, onde as mulheres estão inseridas, em publicações e eventos jurídico-tributário. Em setembro de 2021, inspiradas na Carta Aberta circulada por Civilistas, a Dra. Fernanda junto com a Dra. Raquel Elita Alves Preto e outras mulheres tributaristas, membras de diversos coletivos e associações jurídicas, criaram um movimento através de uma carta de repúdio à reiterada ausência de diversidade racial e de gênero nas publicações e eventos, assinando a tal carta e encorajando outras pessoas a assinarem, manifestando apoio a esta causa coletiva.  Una-se a este movimento compartilhando e assinando a  carta. Clique no link abaixo:

https://forms.gle/Jo8WfUS42t2gygUw8

Ana Gabriela Maia, mulher, negra, diretora em uma conceituada empresa de auditoria também experimentou ser única no início de sua carreira, ao compor equipes e galgar posições em uma área ainda predominantemente masculina. No entanto, o que ela chama a atenção é que as mulheres colocam limitação nas áreas em que podem atuar. Hoje ela vê muito mais oportunidades de ingresso na carreira para as mulheres em sua área de atuação, mas confronta-se com um número pouco expressivo de mulheres que se inscrevem nos processos seletivos. Atuante em órgãos que representam sua categoria, ela vê com muito otimismo as discussões para a inclusão de minorias e as ações que estão sendo implementadas com êxito, principalmente em seu escritório.

Por outro lado, tão longe de denotar os aspectos positivos, como competência, destaque e exclusividade, a palavra “única” mostra-se fria e dura, como um punhal, gerando uma sensação de profunda solidão, que no caso da Dra. Fernanda Matias, Doutora em Biotecnologia pela USP, Docente na Universidade do Semi-Árido em Mossoró e empreendedora da Inovação, resultou em seu afastamento há 2 anos atrás de suas atividades por conta de um quadro severo de depressão. As micro agressões constantes por atitudes e palavras, fundamentadas unicamente por machismo, as dificuldades de ascensão por igual motivação, as lutas diárias para vencer muitas batalhas, o assédio moral e sexual ao empreender em um meio onde os investidores são homens, a levaram à exaustão e muitos problemas de saúde. Mas a experiência de ver paradigmas quebrados tais como a faculdade ser usada como um meio para conseguir melhores casamentos na região em que atua, sua representatividade e exemplo como forma de empoderamento de suas alunas, é o que a motivou a retomar suas atividades.



sexta-feira, 29 de outubro de 2021

 SER OU NÃO SER? EIS A QUESTÃO

 

Na abertura de trabalhos do WIT – Women in Tax Brasil, Andréa Piscitelli, conferencista e professora de renomadas universidades, em sua fala, mencionou o quanto as mulheres são únicas nos ambientes profissionais, principalmente, quando ascendem em suas carreiras.

Tão longe de denotar os aspectos positivos, como competência, destaque e exclusividade, a palavra “única” mostrou-se fria e dura, como um punhal, gerando uma sensação de profunda solidão. Ao ressoar em meus ouvidos, seguiu como eco contínuo por todo meu ser. Lembranças emergiram das inúmeras ocasiões em que fui única.

Olhei ao redor. Expressões reflexivas estampavam as faces daquelas mulheres lindas, fortes e competentes. Elas sentiram o mesmo impacto. Restou evidente que apesar de termos maior representatividade no mercado de trabalho, na política e nos meios de formação, sejam estes técnicos ou acadêmicos, em muitas ocasiões ainda somos únicas.

A verdade é que ser única nos torna sozinhas e como já dizia o poeta: É impossível ser feliz sozinho.

Esta solidão cansa. As mulheres estão cada vez mais sozinhas e em muitas ocasiões, não encontram nos homens de seu dia-a-dia o apoio que necessitam em todas as suas jornadas. Por outro lado, uma rivalidade entre as mulheres é alimentada e incentivada como forma de enfraquecer a sororidade tão necessária para nos mantermos fortes.

Outro ponto observado é que ser “única” significa que as mulheres ainda tem um longo caminho pela frente para ocuparem posições, para de fato assegurar, convalidar e firmar a presença feminina em todos os âmbitos da sociedade.

Não podemos deixar de ressaltar que muito foi conquistado como direito ao voto, de receber herança, de se divorciar, ingressar em universidade ou em cursos técnicos, no mercado do trabalho, de ter maior independência financeira, mas, ainda somos minoria e com direitos inferiores aos dos homens. 

No entanto, parece ter havido um “despertar”, gerando nas mulheres uma necessidade cada vez maior de se associar a outra. Um grande volume e dos mais variados tipos de associações formadas por e para mulheres, tem sido crescente e uma tendência mundial.

Mas o que isso tem a ver com o título deste artigo? Respondo. Tudo.

Shakeaspeare nos confronta com a pergunta” Ser ou não ser?”, ao mesmo tempo que nos apresenta um desafio com sua resposta “Eis a questão”.

O ser homem ou ser mulher é o que deveria definir qualquer coisa em nossa sociedade? Não bastaria para nós sermos? Simplesmente sermos? De fato, há a necessidade de segregarmos a sociedade em homens e mulheres? Ou pior, de sermos obrigados a nos organizarmos e associarmos por sermos de sexos diferentes ao invés de pensarmos em nos unirmos para a consecução de objetivos comuns? Por que deveriam as mulheres terem que se organizar entre si para poderem exercer seus direitos? Faz sentido para o bem comum segregarmos uma mesma categoria entre homens e mulheres? O que eu sendo mulher posso querer para minhas áreas de formação, quais sejam, contabilista, advogada, escritora que um homem também não queira?

Até quando o Ser homem, mulher ou não ser será a questão?